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Mulheres que cuidam demais... Onde fica o autocuidado?


O objetivo principal deste texto é promover uma breve reflexão a respeito do cuidado e autocuidado. Contudo, sob o ponto de vista de mulheres que cuidam demais, que se doam demais, nos diferentes tipos de relacionamentos, tanto amorosos quanto com os diversos membros da família, tais como pai, mãe, irmãos e filhos.

Para tanto, faz-se necessário introduzir o termo codependência emocional como central na compreensão desta reflexão.

A co-dependência emocional é caracterizada por uma forma de se relacionar onde uma pessoa apresenta necessidade exagerada de cuidar do outro. De acordo com Oliveira (2004), “embora não seja catalogada oficialmente como transtorno mental, hoje a codependência é tida como um distúrbio da mente”. Dessa forma, entende-se que a codependência consiste em depender da dependência do outro em relação a si mesmo.

Historicamente o termo co-dependência surgiu na década de 70, cujo pensamento central na época, era que codependentes eram aquelas pessoas, geralmente esposas de dependentes de álcool que frequentavam os Grupos de Alcoólicos Anônimos (AA). Nesses grupos de esposas, notou-se que as mesmas possuíam um denominador comum, onde toda a vida familiar girava em torno do alcoólatra.

Segundo Beattie (2015) “os codependentes emocionais eram, inicialmente, pessoas cuja vida se tornara incontrolável como resultado de viverem em um relacionamento comprometido com um alcoólico”. Os profissionais e estudiosos da área começaram a notar que a relação de codependência emocional podia também ser encontrada em relacionamentos íntimos com qualquer pessoa emocional ou mentalmente comprometida, ou seja, não somente restrita à temática do alcoolismo.

A partir de então a definição de codependência foi se ampliando e se estendendo para relações que iam além da dependência química. Segundo Carvalho e Negreiros (2011), “a codependência emocional se caracteriza por uma relação entre duas pessoas e a sobrevivência de um indivíduo e sua saúde mental dependem da forma como esse relacionamento se estabelece, porém se percebe que existem indivíduos que se relacionam de forma que foge dos padrões esperados pela sociedade, tornando-se dependentes de outras pessoas como forma de condução para suas próprias vidas”.

De forma mais ampliada, compreende-se que a codependência emocional se baseia em uma relação disfuncional que distorce a forma como as pessoas se envolvem emocionalmente. A pessoa codependente acredita piamente que o outro depende dela, precisa dela sempre e acima de tudo.

Para Beattie (2015), ”codependente é uma pessoa que tem deixado o comportamento de outra pessoa afetá-la, e é obcecada em controlar o comportamento dessa outra pessoa”. Essa outra pessoa pode ser, a mãe, o pai, o marido ou um filho, desde que este apresente certa fragilidade emocional (mesmo que temporária) e demonstre necessidade de cuidado e atenção.

Estudos mostram que há um perfil comum entre os codependentes, cujas características mais frequentemente encontradas são impulsividade, medo, insegurança, dificuldade em expressar sentimentos, incerteza do futuro, medo de errar, culpa, justificativa para o insucesso, necessidade de ser útil acompanhada de sofrimento, competição e disputa para sempre ter razão, ambivalência entre afeto, raiva e frustração, baixa autoestima, ansiedade em querer mudar o outro e controlá-lo, vitimização, estresse, mágoa, autodesvalorização e desespero (Carvalho e Negreiros, 2011).

No que se refere ao impacto nas relações estabelecidas pelo codependente emocional, se destacam a compulsividade e a distorção de limite, sendo que o codependente tende a assumir indevidamente a responsabilidade quase que total pelo cuidado do outro (Zampieri, 2004a, 2004b). No âmbito familiar, em se tratando de mulheres com esse perfil, é comum que elas assumam a maior parte das responsabilidades com o cuidado de todos, filhos, marido, casa, etc. E normalmente apresentam doses exageradas de sobrecarga física e mental, além dos prejuízos na autoestima e autocuidado.

Em pesquisa realizada por Carvalho e Negreiros (2011) para compreender a codependencia emocional na perspectiva de quem sofre, as autoras trazem contribuições valiosas a respeito do tema. Afirmam que “o codependente tem uma baixa autoestima e por se perceber através da opinião do outro, ele não é capaz de perceber seus sentimentos, quando estes se referem a sua própria pessoa”. Daí a dependência pela relação, centrada no outro, nas necessidades do outro acima de tudo.

O impacto destrutivo desta forma de se relacionar se estende a todos que se relacionam com esta mulher, que tende a assumir diversas funções de cuidado. Na maioria das vezes e como reação à dedicação excessiva ao bem-estar do outro, sente-se abusada e negligenciada, com sua autovalorização reduzida.

O co-dependente, e especificamente as mulheres codependentes emocionais, precisam aprender a estabelecer limites e se impor nas relações que estabelecem, para que suas necessidades sejam atendidas com mais propriedade. Como bem nos lembra Oliveira (2004), ser capaz de entender que dizer "não" àqueles com quem estabelecem esse relacionamento co-dependente não trará consequências desastrosas.

Aprender a se reconhecer nesse perfil de relação é imprescindível para transformar a qualidade da relação consigo mesma e com o outro.

Referências

Beattie, M. (2007). Co-dependência nunca mais. Rio de Janeiro: Nova Era.

Carvalho, Leilanir de Sousa, & Negreiros, Fauston. (2011). A co-dependência na perspectiva de quem sofre. Boletim de Psicologia, 61(135), 139-148. Recuperado em 18 de junho de 2019, de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0006-59432011000200002&lng=pt&tlng=pt.

Oliveira, A.P. (2004). Co-dependência é um distúrbio mais frequente do que se imagina. Folha de São Paulo Online. São Paulo, 12 de agosto de 2004. Recuperado em 27 de junho, 2009, de http://www1.folha.uol.com.br/folha/equilibrio/noticias/ult263u3696.shtml.

Zampieri, M.A.J. (2004a). Co-dependência: O transtorno e a intervenção em rede. São Paulo: Agora.

Zampieri, M.A.J. (2004b). Transtorno de personalidade co-dependente: Discussão sobre classificação diagnóstica e manifestações sistêmicas. Revista Brasileira de Psicoterapia, 6 (2).


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