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A Partir do Amor de Mãe!


A partir do amor e dedicação à busca de conhecimentos, por parte de estudiosos do psiquismo humano, tais como Bion, Winnicott, Zimerman, Moraes, Maldonado, Klaus, entre outros, foi possível o encantamento para a realização do trabalho que aqui segue.


Todo o ser humano é constituído, somática e psicologicamente, de forma singular, única, de acordo com as experiências mais primitivas de sua vida.


A formação do psiquismo do bebê depende tanto do funcionamento do psiquismo do responsável por sua maternagem, como de contingências que cercam seu nascimento, além, é claro, das questões ambientais e de suas próprias questões orgânicas.


Para o bebê existir de fato como pessoa, e crescer de forma adequada, ele precisa ser amado e atendido, tanto em suas necessidades de afeto, como nas suas necessidades orgânicas. Para tanto, é necessário que sua mãe (ou o responsável por esta função) o acalente de forma amorosa, através do colo, carícias, olhar e conversas com o bebê, e o atenda em suas demandas, aliviando seus desconfortos físicos.


Quando o bebê nasce, ele se encontra totalmente desorganizado e desestruturado. Apenas vivencia as sensações físicas intrínsecas a este momento, relacionadas com fome, dor, frio, sede, etc, sem entender do que se trata. Além de ser acolhido, cuidado, alimentado, ele precisa se sentir amado. Precisa de colo e afeto, do olhar e do amor de sua mãe. A forma de segurar, conter e acalentar o bebê possui uma relação com a organização emocional e integração deste bebê. Essas atitudes, ocorrendo de forma adequada, permitem que ele consiga suportar e superar os desconfortos gerados pelas questões inerentes ao estar vivo.


Cabe à mãe o acolhimento do bebê. Ao conseguir estar atenta ao seu filho, a mãe é capaz de identificar o que está acontecendo com ele, decodificar e nomear suas sensações e sentimentos a fim de que o mesmo consiga assimilá-los. Por meio dos olhos da mãe, o bebê pode se ver. Os olhos da mãe confirmam, aprovam, desaprovam, dão um sentido de identidade da criança. A partir do olhar materno, especialmente, do encantamento da mãe para com o seu filho, este tem a chance de se constituir como sujeito.


O encantamento e investimento amoroso de uma mãe para com seu filho, tem um papel fundamental no desejo de viver e na possibilidade dele se desenvolver. Ao se sentir olhado e amado, o filho se sente existindo e encorajado a seguir em frente. Através do olhar desejante de sua mãe, um filho tem a possibilidade de crescer. Desejante no sentido de esperar e desejar a evolução deste ser, desejar e acreditar em sua capacidade, em suas conquistas e vitórias.


Para a mãe conseguir realizar a sustentação corporal e emocional do bebê, responsável entre outros fatores, pelo existir e crescer deste bebê, é necessário que haja uma regressão desta mãe. Esta regressão é que permitirá que ela consiga se identificar com este bebê, e seja capaz de sentir e decodificar os sentimentos dele. Nesse estado, ela consegue decifrar para ele suas vivências sensoriais/corporais, aliviando e nomeando suas angústias. Este modo de agir da mãe, possibilita a integração deste ser e posterior diferenciação entre eles, propiciando a ocorrência de processos emocionais fundamentais: integração, personalização e realização.


Muitas vezes, em virtude das experiências da mãe (e/ou de ambos os pais), este estado desejado e esperado, nem sempre é possível de acontecer. Considerando que todas as mães têm sua história de vida individual, suas angústias e vivências conscientes e inconscientes, torna-se inevitável a interferência dessas variáveis no processo da maternagem.


A vida pregressa e a vivida no momento da gravidez e nascimento do bebê tem influência significativa no cuidado para como o mesmo. Diversos são os fatores que interferem na realização da maternagem, entre eles: o modo como ocorreu a constituição do bebê e sua chegada para a família (incluindo as questões relacionadas com a saúde dele, da mãe e de toda a família); as circunstâncias em que a gestação aconteceu (desejada ou não, etc.), e se esta está relacionada mais com o crescimento ou com a repetição patológica de histórias e experiências não elaboradas; a dinâmica familiar existente; o momento de vida atual, etc. Todos essas circunstâncias, influenciam o modo de funcionar desta dupla mãe-bebê e a qualidade da maternagem realizada.


Se esta mãe foi ou está sendo cuidada, ela tem grandes chances de conseguir cuidar de seu bebê, e ajudá-lo em seu desenvolvimento. Ela, para conseguir dar o amparo necessário a condição deste bebê existir, precisa ter sido amparada, ou estar sendo amparada neste momento do cuidado com o bebê. Ao pai e demais familiares, cabe então apoiar e acolher esta mãe. Existe uma influência do modo como os pais foram cuidados, na forma que conduzirão o processo de atendimento ao seu filho.


Tendo em vista que as mudanças que ocorrem no modo de ser, pensar e agir da mulher ao se tornar mãe, bem como a reativação dos conflitos emocionais existentes e a re-vivência de situações primitivas por parte desta, interferem no modo como efetuará o cuidado para com seu futuro bebê, seria de grande valia o cuidado para com esta nova mãe. Uma ”maternagem” adequada desta também se faz necessária, uma vez que a forma como ela estiver sendo cuidada e olhada, atendida neste momento de sua vida (no qual precisa conseguir olhar o outro ser), é crucial para uma boa resolução da maternagem de seu filho. Se ela se sente amparada e cuidada, e encorajada a decifrar as necessidades de seu bebê, torna-se mais possível o sucesso de sua função de mãe.


Quando esta mãe não foi nem está sendo cuidada, pode ser incapaz de atender de forma adequada o seu bebê. Dependendo de seu estado emocional, precisa urgentemente ser amparada, a fim de evitar danos maiores ao seu filho e a si mesma. Mães apáticas ou deprimidas, por exemplo, podem não conseguir, sem ajuda, realizar o investimento necessário para o crescimento de seu filho.


Nos casos onde as necessidades básicas do bebê não foram sistematicamente atendidas, pode ocorrer um rompimento do seu desenvolvimento. Experiências precoces de falta de amor, segurança e confiança, juntamente com a negligência contínua das necessidades básicas, agressividade e humilhação geram inevitavelmente o vínculo do ódio e falhas difíceis de serem reparadas. A partir de uma grande falha, falta e/ou frustração ocorrida nas fases mais primitivas do desenvolvimento do ser humano, há a possibilidade do indivíduo cindir com a realidade e um processo deteriorativo de suas funções psíquicas acontecer.


As falhas na função materna, as quais podem tanto ser relativas à ausência excessiva da mãe, a sutis desordens na designação de papéis a serem cumpridos na dinâmica familiar, ou à comunicação, bem como, estarem relacionadas com a proteção extrema da mãe (mães sempre presentes, prevenindo e impedindo os desejos das crianças), entre outras, são prejudiciais para a constituição psíquica do filho.


A ausência excessiva da mãe, impede que a criança conecte o tempo de espera das necessidades às representações do objeto desejado. O que faz com que uma criança consiga esperar pelo seu alimento, pelo seu cuidado, é a experiência de ter sido atendida anteriormente. Mas quando isto não foi vivenciado, gera uma frustração estruturante, um temor de aniquilamento, semelhante ao vivenciado na fase inicial de sua vida. Quando o tempo entre o desejo e a satisfação deste, é muito curto ou muito longo, não há a significação desta falta, gerando lacunas no psiquismo. Quando a mãe não decodifica as sensações vividas pelo bebê, estas sensações são experimentadas como aterrorizadoras.


Vale ressaltar que não se trata de perfeição, de ter que atender sempre prontamente o bebê e não falhar nunca em seu papel de mãe. Estas falhas são inclusive esperadas e fazem parte do ser humano, ocorrendo inevitavelmente, também, no desenvolvimento normal de uma relação entre a mãe e seu bebê. É a negligência sistemática e contínua com os cuidados básicos, o não atendimento constante ao choro do bebê, o não acolhimento deste e a falta de amor, entre outros, que produzem as falhas maternas importantes que deixam marcas no psiquismo do filho. Essas marcas deixadas no psiquismo são, por vezes, irreversíveis, principalmente quando se trata de negligência dos cuidados básicos e abusos precoces, tanto físicos como psicológicos.


Então, quando a mãe não consegue conter as angústias do filho, não consegue nomear e dar sentido ao que acontece com a criança, não consegue ter o olhar desejante, entre outros, abrem-se lacunas na vida deste, que precisarão ser preenchidas.


Com a figura do terapeuta, o paciente (que tanto pode ser essa mãe, ou esse filho no futuro), ao ser olhado e cuidado, tem a possibilidade de reeditar sua história, de refazer esse processo que não ocorreu adequadamente.


Através da relação psicoterapêutica, uma relação com o olhar desejante de progresso, respeito e cuidado - tal qual uma mãe deveria idealmente realizar com seu filho -, é possível o crescimento e desenvolvimento, tendo em vista o preenchimento das lacunas. Não sem dor e sofrimento, mas com amor e a partir do amor.


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